Imagine a seguinte situação: um funcionário de uma empresa de tecnologia decide, ao sair, levar consigo uma lista de clientes e informações estratégicas para fundar sua própria startup. Ele começa a contatar antigos clientes, oferecendo serviços similares a preços mais baixos. Essa prática não só prejudica a empresa original, mas também caracteriza concorrência desleal.
A concorrência desleal é tida como a prática industrial ou comercial desonesta entre empresas ou entidades que atuam no mesmo segmento ou mercado que oferecem produtos ou serviços semelhantes.
Esta prática ocorre quando uma empresa ou pessoa usa métodos desonestos para ganhar vantagem sobre a concorrência. Isso pode incluir enganar clientes ou copiar produtos de forma ilegal. A Lei de Propriedade Industrial (Lei de nº 9.279/1996), divide a concorrência desleal em dois tipos: concorrência específica e concorrência genérica.
A concorrência desleal específica está prevista no art. 195 da Lei de Propriedade Industrial e inclui condutas consideradas crimes de concorrência desleal, como, por exemplo, realizar anúncios falsos para afirmar que o produto de uma empresa causa problemas de saúde, estimulando os clientes a deixarem de comprar dessa empresa.
Já a concorrência desleal genérica tem previsão no art. 209 da mesma lei e é composta por práticas que contrariam as boas normas da concorrência comercial, como usar a marca ou o logotipo de uma empresa famosa para confundir e atrair clientes.
Os tribunais superiores entendem que a concorrência desleal se caracteriza quando há uma intenção de captar a clientela de um concorrente, causando danos e prejuízos ao seu negócio. Para que isso ocorra, é necessário que a conduta envolva o uso de meios fraudulentos, com o objetivo de confundir o consumidor e obter vantagem ou proveito econômico.
Como a concorrência desleal se manifesta durante o contrato de trabalho?
Nas relações de trabalho a concorrência desleal é prevista no art. 482 “c”, da CLT, como “negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço”.
Dessa maneira, comete concorrência desleal quem divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos, informações ou dados confidenciais, utilizáveis na indústria, comércio ou prestação de serviços, excluídos aqueles que sejam de conhecimento público ou que sejam evidentes para um técnico no assunto, a que teve acesso mediante relação contratual ou empregatícia, mesmo após o término do contrato.
Posso demitir por justa causa empregado que está concorrendo com a minha empresa?
Durante a vigência do contrato de trabalho, ainda que não haja expressa previsão contratual sobre a não concorrência, subentende-se pela CLT que é vedada a concorrência do empregado com seu empregador, uma vez que a relação de emprego se baseia nos princípios da lealdade e da confiança. Assim, caso o funcionário cometa algum ato de concorrência contra a empresa em que trabalha, poderá ser demitido por justa causa.
Para encerrar o vínculo empregatício por justa causa devido à concorrência desleal, é fundamental que o empregador reúna provas robustas que justifiquem a demissão, como por exemplo: documentos, prints de whatsapp, análise de comunicações, registros de acesso, testemunhos e evidências que comprovem que o funcionário agiu com a intenção de desviar os clientes da empresa ou de se apropriar ilegalmente de informações, tecnologias ou da clientela.
Como fica a proteção à concorrência após o encerramento do vínculo de emprego?
O primeiro ponto a se analisar em situações em que está se discutindo concorrência desleal de ex-empregado é se no contrato de trabalho pactuado entre as partes existia a cláusula de não concorrência, mais conhecida como non compete. Esse tipo de cláusula estabelece que o empregado não poderá concorrer de forma direta ou por meio de terceiro, por um determinado período e sob um determinado local, com a sua empregadora.
A cláusula de não concorrência possui alguns requisitos e limitações para ser considerada válida. Esses requisitos incluem: a necessidade de estar formalizada por escrito, a limitação temporal, a definição de um ramo de atividade específico e a delimitação de um território. Além disso, a cláusula deve prever uma indenização em dinheiro, que serve como forma de compensação financeira pelo período de não concorrência.
Na existência dessa cláusula, o empregador poderá entrar na justiça, de forma resguardada, contra seu ex – funcionário, pleiteando a devida indenização pelos danos causados e o encerramento imediato da atividade tida como ilícita.
E se o ex-funcionário não assinou nenhuma cláusula de não concorrência?
A princípio, nos casos em que empregado após ser demitido ou pedir demissão, montar uma empresa no mesmo ramo empresarial do seu ex -patrão, não se configura como prática desleal, principalmente porque a Constituição Federal prevê o direito à livre concorrência em seu art. 170, IV.
De modo que se faz necessário a cláusula ou termo de não concorrência escrita e assinada para enquadrar a ato praticado pelo ex-funcionário como concorrência desleal.
Assim, tem-se que se o ato de concorrência desleal ocorre após o término do contrato de trabalho e que esse ex-funcionário não assinou a cláusula de não concorrência, na seara trabalhista a empresa não terá força jurídica para recorrer à justiça.
Entretanto, nos casos em que não há a assinatura da cláusula de não concorrência e um ex-funcionário pratica atos de concorrência desleal, o mais recomendado é que, primeiramente, seja enviada uma notificação extrajudicial. Se o ex-empregado continuar com a prática, o próximo passo é registrar um boletim de ocorrência e buscar a justiça para pleitear danos morais e materiais, visando à cessação das atividades de concorrência. De toda forma, o ideal é sempre agir de forma preventiva, incluindo a cláusula de não concorrência nos contratos de trabalho.
Assim, para evitar problemas e contratempos relacionados à concorrência desleal por parte de funcionários, o primeiro passo é revisar os contratos de trabalho existentes ou elaborar novos contratos que incluam uma cláusula específica de não concorrência.
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